domingo, 11 de abril de 2010

Marés

I

A água batia nas rochas violentamente, mesmo assim o mar acalmava-me, fazia-me sentir serena. O tempo já tinha escurecido, mas o roxo do pôr-do-sol ainda se reflectia na areia. Ele tinha adormecido encostado ao meu ombro. Sorri, já tinham passado quatro anos desde do inicio da nossa amizade, e que quatro anos! Já tínhamos passado tanta tristeza, tanta alegria, tantas zangas, mas continuávamos os mesmos malucos desde do primeiro dia.

Os seus pequenos suspiros preenchiam o barulho do mar no silêncio da noite. Este cenário era-me familiar, já tão familiar.

O telemóvel toca. Era a mãe. O jantar estava pronto.

-“Diz à sogrinha que ponha mais um pratinho para mim.”

Tinha ele acordado com o barulho do telemóvel.

-“Achas que ela se ia esquecer de ti parvinho?”

Ele beijou a minha testa, “beijo de juízo”, como ele me costuma dizer, como eu tivesse pouco. Abraçou-me.

-“Estás gelada! Não tens frio?”

Ele tinha razão, a minha pele estava fria, mas eu não tinha dado por ela. Ainda era o inicio da primavera, as noites ainda eram frias mas eu tinha-me esquecido de trazer o casaco, estava na mala do carro.

Sinto uma camisola nas pernas.

-“Veste. Não te podes constipar.”

Visto a camisola, era-me grande mas sentia como me servisse perfeitamente. Cheirava ao seu perfume, Armani, o presente que lhe tinha dado no seu último aniversário.

Ele deitou a sua cabeça no meu colo.

-“Tenho preguiça.”

-“Já nasceste com preguiça, conta-me algo de novo…”

-“Novo? Hmmmm, estás muito bonita assim com a minha camisola!”

Sorri.

-“Hahaha. É mesmo a minha cor não é? É minha agora!”

Ponho a língua de fora.

-“Pronto, ela é tua por hoje.”

Faço-lhe festinhas no cabelo. Estava grande, mas gostava de o ver assim.

Fecha ele os olhos.

O telemóvel toca.

-“Vamos embora antes que a sogrinha me bata.”

Andamos até o carro, o braço dele à minha volta. Sentia-me pequena, mas sentia-me bem.

Abre-me a porta e sento-me.

Ligo o carro.

Ele senta-se.

Partimos.

(…)

Saímos, depois do jantar. A pé. A caminhada do costume.

-“Tenho a barriga mesmo cheia. A tua mãe sabe conquistar-me, sabes?”

-“Cheira-me que vou ter um padrasto.”

-“Hahaha, primeiro tinha que me casar contigo.”

-“De que estas a espera?”

-“De ganhar o dinheiro para te dar o diamante que tanto queres.”

Sorri.

Flashback:

À 2 anos atrás, no casamento da prima Maria, estavamos sentados na mesa com um jovem casal que estava noivo.

-“Ai, Fi, quero um diamante igualzinho a este. É perfeito!”

-“Pronto, eu compro-te um igual.”

-“Prometes?”

-“Prometo.”

Presente

Após o jantar, fomos ao jardim onde costumamos ir e sentei-me no banco do costume. Ele senta-se no meu colo.

-“Hoje sou o bebé.”

-“Sempre foste o meu bebé.”

Sorri.

Ele fixa o seu olhar num gato que estava no outro lado do jardim.

-“Posso te fazer uma pergunta?”

-“Podes.”

-“Amanhã. De manhã. És minha não és?”

-“Sempre fui. Sou agora até, não vês?”

-“Sabes que não foi isso que eu quis dizer. Amanhã vens ter comigo?”

-“Claro!”

Ele olha seriamente nos meus olhos.

-“Deixas-me fazer uma coisa?”

-“O quê?”

-“Deixas?”

Hesitante, respondo.

-“Podes claro.”

Não reparei no que ele fez, fiquei pasmada. Os lábios dele eram doces, acolhedores. Nunca me tinha sentido tão confortável.

Fiquei sem palavras e beijei-o de volta.

Silêncio.

Eu não sabia o que dizer. Estava preenchida.

Ele pegou na minha mão que estava a tremer. Encostei a minha cabeça no seu ombro.

(…)

Chegamos ao carro dele.

Ele abraçou-me, um abraço longo.

Voltou a beijar a minha testa.

-“Amanhã estarei a tua espera.”

Filipe pisca-me o olho.

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